Proponho – me aqui a discorrer sobre o Lazer. Muitos leitores podem achar isso um desatino, pois vivemos em um estado que sofre muito por causa do desemprego, sendo este, inclusive, o maior responsável pelo êxodo em massa de alagoanos para o sul e sudeste do país – e, agora, de forma mais marcante, para o centro – oeste. Quero aqui analisar o Lazer – ou a falta dele – dos trabalhadores rurais. Essa categoria tão útil à indústria sucroalcooleira e ao mesmo tempo tão carente de tempo e espaço para a sua humanização.
Usando as taxonomias de especialistas na área, como Sandra Bacal, vê – se que o “tempo livre” do “bituqueiro”, do irrigante, do cortador de cana, é somente um tempo para repor as energias, visando a cair na lida depois de algumas horas. Lazer é descansar, repor as energias para trabalhar em seguida? Ou o Lazer é mais que isso, um fim em si mesmo? Vem de longe essa discussão. Na verdade, pensadores clássicos como Sêneca já chamavam a atenção para o fato de que o ócio – uma das definições dicionáricas de Lazer – não consiste em sentar e cruzar os braços, apenas; mas praticar o ócio significa realizar atividades que tragam gozo ao indivíduo, realização e deleite. Esse raciocínio vem sendo desenvolvido e aprimorado no passar dos anos. Nesse sentido um sociólogo francês contemporâneo, Joffre Dumazedier, sustenta que o Lazer é um conjunto de atividades às quais o indivíduo se entrega a fim de recrear – se, divertir – se, informar – se e formar – se, após se ver livre dos encargos profissionais, sociais e familiares. Ora, depreende – se daí que a atividade de Lazer é mais que chegar em casa “arriado”, tomar café e dormir por seis horas, para retomar a árdua tarefa no frio da madrugada!
No contexto dos trabalhadores rurais, o “tempo necessário” – aquele dedicado ao trabalho – invade de modo bravio o “tempo liberado” – aquele dedicado ao descanso e à distração. Além de enfrentar jornadas que chegam a 14 horas diárias, o trabalhador ainda é atendido com um sistema de transporte precário, que demora tanto para deixá – lo no trabalho quanto para colocá – lo
Outra questão problemática que se apresenta é o que as cidades propõem como possibilidades de Lazer. Vê – se nos municípios do interior uma desenfreada aparição de praças. Não quero dizer aqui que estas são irrelevantes. Mas, pergunto, isso basta? Será que nossas cidades não precisam de mais espaços nos quais se cultive o gosto pelo cinema, pela música, pelo teatro, etc.? Já bem afirmou Nelson Carvalho Marcellino sobre o Lazer, que o mesmo busca o “humano no homem”; é incrível notar o quanto de humanidade falta em muita gente. Isso devido ao distanciamento de si mesmo causado por uma lógica bem expressa na música “Capitão de Indústria”, do grupo Paralamas do Sucesso, que diz: “(...) eu durmo prá trabalhar, eu acordo prá trabalhar (...)”. Ainda na canção, o sujeito afirma não ter o tempo livre, em que “ele é ele mesmo”, em que nada tem para fazer. Fica a angústia da utopia, minúscula frente àquilo que Bourdieu denominou “Estrutura Estruturante”.
E para finalizar, como se sabe, as oportunidades de emprego para o trabalhador rural são sazonais. E aí surge um objeto de estudo sócio – antropológico muito interessante: após o fim da safra, muitos trabalhadores são dispensados – alguns com Seguro – Desemprego e outros não – e uns poucos permanecem a prestar serviços. Estes últimos vão permanecer no bojo das condições de Lazer apresentadas, precárias ou inexistentes. E os primeiros vão oscilar entre o tempo livre, muito caro aos mais jovens, e a busca dolorida pelo “ter o que fazer” em sua cidade ou em outro estado, sendo isso preocupação mais arraigada naqueles mais velhos que têm mulher e filhos. Numa situação dessas, onde entra o Lazer?
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